Maria do Milagre


Maria estava deitada na cama com seus 3 filhos. Eram mais de 22 horas, e ela tentava fazer o caçulinha, Pedro Henrique, de apenas 3 anos, dormir. Ele chorava baixinho de encontro ao seu peito, um choro dolorosamente infantil.
– Pedrinho, pare de chorar filho… Mamãe está aqui e amanhã tudo vai melhorar.
– Eu tô com fome mãe. Minha barriguinha tá doendo…
– Mamãe vai te dar um copo d’ água e e você vai dormir, amanhã nós vamos comer bastante, a mamãe promete…
Grossas lágrimas escorreram pela sua face, e levantando-se rapidamente teve tempo de  disfarçá-las. Pegou na pia um copo, encheu-o de água e com um restinho de açúcar num pote, adoçou-o para ver se aquilo enganaria a fome do filho…
– Tome Pedrinho, tome..
– Hum tá gostoso mãe…tem mais?
– Não Pedrinho, não tem…amanhã eu faço mais tá bom? Dorme agora filhinho.
A revolta

Pedrinho não tardou a dormir e Maria ficou ali, olhando pelo buraco do teto do barraco que lhe servia de moradia, viu algumas estrelas no céu, revoltou-se mais uma vez com Deus…
– Ah! Jesus, se você existisse mesmo, será que seria tão cruel ao ponto de ver meus filhos chorando de fome?

(a história continua…)

Será que se você existisse mesmo ficaria ai no bem-bom do céu sem fazer nada? Onde está a misericórdia divina? Será que é a morte, a tão propagada libertação de Deus?
Qual mãe, qual pai merece ver um filho chorando de fome?
Eu já nem ligo pra mim, mas pra eles, eu …eu…
As lágrimas desciam como rio em sua face, a garganta queimava, e ela não conseguia mais falar. Foi deitar com a revolta entalada no peito…
O Sonho
Já deitada, adormeceu e se viu em um platô de uma montanha, cercada por centenas de pessoas, ela estava sentada e esperava por alguém que iria falar. Todos que estavam ali já tinham ouvido falar do jovem Nazareno que segundo alguns, fazia milagres por onde passava. Ela, no fundo do seu coração duvidava que alguém pudesse fazer algum milagre. Mas, eis que surge um jovem de sandálias e túnica, que não impressionavam tanto, parecia ser igual aos demais, até que abriu a boca e disse:
–  Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados.
Aquela voz tinha uma força, uma profundidade que calou a sua alma aflita. Em respeito silencioso, Maria bebia cada palavra que Ele dizia. Quando Ele acabou de falar, percebeu que ninguém se levantara, ninguém queria ir embora. Muitos ainda tinham lágrimas nos olhos. Foi quando aconteceu algo estranho, ela passou a ouvir a voz dele falando para um dos seus:
“- Não precisam ir embora; dai-lhes vós de comer.
Então eles lhe disseram: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes.
E Ele disse: trazei-mos aqui.
Tendo mandado às multidões que se reclinassem sobre a relva, tomou os cinco pães e os dois peixes e, erguendo os olhos ao céu, os abençoou; e partindo os pães, deu-os aos discípulos, e os discípulos às multidões.Todos comeram e se fartaram; e dos pedaços que sobejaram levantaram doze cestos cheios.
O recado

Maravilhada, Maria ouviu ainda, como que se falasse só para ela:
– Veja Maria, eu poderia fazer o milagre sozinho, mas eu pedi a colaboração das pessoas. Assim, alguém determinado, pescou esses peixes, e mãos laborosas, forjaram o trigo para  fazer o pão. Por isso, não te revoltes contra os céus, antes, levanta e trabalha desde o amanhecer, assim, ao invocar a proteção, vai descobrir que o maior milagre está em você mesma.

A reviravolta

Maria acordou com esse sonho que parecia tão real, martelando em sua cabeça. Ao ver os filhos ainda dormindo, levantou-se e ao contrário do que sempre fazia, não parou para reclamar. Pegou o botijão de gás que estava vazio no fogão velho, e com esforço, levou-o ao depósito de gás e vendeu-o. Com o dinheiro arrecadado, comprou pão e leite e reservou a maior parte. Voltou para casa, deu um café da manhã reforçado para os filhos e pediu para o mais velho cuidar da casa enquanto ela estivesse fora. Com todas as recomendações do mundo, saiu para a rua determinada. Junto a estação ferroviária, ele parou em um atacadista de doces e comprou tudo o que podia com o seu dinheiro, em doces e balas. Ali mesmo, na estação ferroviária, ela armou no chão mesmo, com um pedaço de lona preta emprestada da loja de doces e algumas caixas vazias, a sua própria loja. E para surpresa de todos, ela apregoava bem alto as qualidades dos seus doces.

Pé de moleque sapeca, com mais amendoim e açúcar e custa uma merreca.
Olha o bombom dos namorados. Compre e ganhe uma paixão.

E assim, com um bom humor e alegria contagiantes, Maria viu em poucas horas todo o seu estoque acabar, e ela comprou mais doces, e mais doces, até que o dia estava terminando e ela viu seus bolsos cheios de dinheiro. Voltou para casa com comida comprada em um restaurante barato da região. Naquela noite houve festa naquele barraco. Havia comida e uma esperança: fome nunca mais.

O trabalho
O tempo passou e em poucos meses Maria já conseguira fazer uma poupança razoável. Seu pequeno negócio prosperava,até que recebeu do dono da loja de doces que ela sempre comprava uma proposta. Ele estava cansado e doente e gostaria de vender a loja e por ver a sua determinação, gostaria de vender para ela, pois tinha muito carinho com o negócio que cuidou a vida inteira. Maria, lembrou-se do seu “sonho” e não pensou duas vezes, aceitou a proposta que apesar de ser em prestações, ela sabia que teria que trabalhar muito.

No dia seguinte trouxe os filhos para a loja. O mais velho já começou a ajudar no balcão, os outros dois se divertiam ali mesmo. Nunca haviam visto tanta fartura.O tempo foi passando e Maria resolveu voltar a estudar pois sentia que a falta dos estudos impedia- a de prosperar, pois tinha dificuldades em lidar com os livros fiscais e os números, Em 3 anos concluiu o curso técnico de Contabilidade e nessa mesma época abriu uma segunda loja. Os filho mais velho já assumiu essa nova loja e com a mesma determinação da manhã, fez o negócio crescer muito rapidamente.

Os anos passaram…
Maria agora tem mais de 15 lojas de doces e um grande Atacado que vende para todo o Estado. Mora em um apartamento muito maior que as suas necessidades, tem carros na garagem, diversos empregados, e conclui a sua Faculdade recentemente, mas ainda sentia em si mesma uma grande vazio…
A lembrança de Jesus
Ela sempre recordava do “sonho” que tivera naquela noite distante, e via Jesus repetindo que o maior milagre estava nela mesma, e ela era realmente a prova desse milagre hoje em dia, e parece ter ouvido mais uma vez a voz Dele dizendo:
– Volte para a montanha!

Na mesma hora ela lembrou-se do barraco onde morava. Desceu até o térreo, pegou o carro e sem pensar, voltou para a favela onde morava. Fazia tempo que ela não passava nem perto dali. Parece que a favela aumentou muito…ficou até com receio de parar o seu carro luxuoso ali, mas decidida, desceu e foi pelos corredores estreitos em busca do antigo barraco. Ela sabia exatamente onde era, apesar de ter passado tanto tempo. Muita gente estranhou a presença daquela mulher elegante, com roupas finas e jóias andando pela favela. Atrás dela começava a formar uma pequena multidão de crianças e mulheres que se surpreenderam com a sua presença. Ao ver o antigo barraco ela parou e reviveu por instantes, cenas do passado: fome, humilhação, miséria, dor, revolta e por fim, um Cristo Vivo que a libertou de si mesma. Era isso que ela precisava fazer: era mostrar para as pessoas que não podiam continuar esperando pelo milagre divino, ou pela volta de Jesus para que a miséria acabasse. Era preciso mostrar que o milagre está em cada um, na semente divina que habita em cada ser humano. Ela olhou para trás e viu a multidão de famintos, como naquele dia na montanha, ela olhou para todos, homens, crianças e mulheres  e falou:

–  Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça porque eles serão fartos.

O povo sentou-se por ali mesmo, entre barracos, fome e miséria, Maria começava um novo milagre, transformar poucos pães em alimento sólido, para toda a vida. Ali mesmo, enquanto falava, já via a construção de um galpão com cursos variados que ela ergueria imediatamente, para libertar o próximo da própria miséria.

Enquanto ela falava, Jesus observava de longe a transformação da revolta em exemplo.

Sorrindo, comentava com seus anjos:
– Bendito é aquele que aprende com a própria dor, que transforma revolta em sementes de esperança. São como abelhas que levam o mel das flores e espalham o pólen bendito que transforma a terra em jardim. São os que ouvem a palavra e praticam-na até o último dia de suas vidas.
São mais do que necessárias, são imprescindíveis.
Vamos embora, ela já aprendeu, deixou de ser Maria da Revolta para ser Maria do Milagre.

ACREDITE EM VOCÊ!
Paulo Roberto Gaefke
ww.meuanjo.com.br

[email_link]